quinta-feira, 2 de julho de 2009

O manual do guerrilheiro

No mês passado, 3 000 pessoas se reuniram no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, num protesto organizado por um certo Movimento dos Sem Namorados. Uma passeata nos mesmos moldes havia sido realizada dois dias antes no Rio de Janeiro, levando 500 pessoas a caminhar pelas ruas do centro da cidade em plena sexta-feira, protestando contra o fato de estarem sem um par a poucas semanas do Dia dos Namorados. As manifestações eram, na verdade, uma ação de marketing do site de relacionamento ParPerfeito. Duas semanas antes, a empresa carioca Biruta Mídias Mirabolantes, especializada em ações inusitadas, havia recebido do site a missão de elaborar uma campanha para o Dia dos Namorados com apenas 60 000 reais. Com esse dinheiro, não se compra mais do que um quarto de página de espaço publicitário num jornal de grande circulação. Mas as passeatas renderam mais de 300 matérias de TV, rádio, jornal e internet, o equivalente a 10 milhões de reais em mídia espontânea.

A ação foi um dos mais bem-sucedidos casos de marketing de guerrilha, como são chamadas essas ações promocionais realizadas nas ruas, quase sempre envolvendo o uso da internet, com baixo investimento e que buscam a repercussão por meio do bom e velho boca a boca. A tática de guerrilha se enquadra na categoria do marketing que os americanos definem como bellow the line - ou seja, ações paralelas à publicidade tradicional, voltada para a comunicação de massa. "O marketing de guerrilha se tornou uma opção a mais numa categoria que envolve atividades como eventos, promoções em ponto de venda, e até mesmo ao outdoor, que depois de proibido em São Paulo cedeu espaço a outras iniciativas de baixo custo", diz Rafael Liporace, sócio da Biruta. O número de ações realizadas pela agência reflete essa súbita procura. A Biruta deve fechar 2009 com 270 ações, ante as 88 realizadas em 2006.

As empresas que investem em marketing de guerrilha se dividem basicamente em dois grupos. O primeiro reúne companhias sem recursos para investir em propaganda tradicional. É o caso do site ParPerfeito, que usa basicamente anúncios na internet para se promover e agora busca projeção além dos limites da web. No segundo grupo estão empresas com tradição em investimentos em publicidade convencional mas que procuram diversificar as formas de atingir os consumidores. É o caso da Cadbury Adams, gigante global de chocolates, balas e gomas de mascar. Em novembro, a empresa estreou na guerrilha com uma ação um tanto quanto bizarra promovida pela agência paulista Espalhe para a marca Trident. Para divulgar uma versão da goma de mascar cujo sabor dura mais tempo, o ator Cauã Reymond foi contratado para fazer um filme em que mascava um chiclete durante 15 minutos. O filme foi levado ao ar num site da internet e o chiclete mascado acabou leiloado para fãs interessadas em confirmar se o sabor havia resistido à sessão de mastigação do ator. Foi arrematado por 349 reais. Logo depois, a Cadbury partiu para uma segunda ação, batizada de Speed Dating. Na ação, o metrô de Porto Alegre foi fechado na noite do último dia 20 de junho para realizar o primeiro encontro de 48 casais selecionados por um site de relacionamento montado para a campanha. "São iniciativas pontuais, relativamente restritas, mas que chamam muito a atenção", diz Emilia Bertolli, porta-voz da Cadbury no Brasil.

Da mesma forma que a Cadbury Adams, grandes anunciantes, como Claro, Shell, Gafisa, Cyrela e SulAmérica, descobriram a guerrilha como um recurso extra para reforçar suas marcas (veja quadro). No entanto, produzir ações desse tipo requer cuidados. Normalmente, as ações de guerrilha são planejadas em conjunto com a agência de publicidade responsável pela propaganda das empresas. No caso da carioca Biruta, por exemplo, 60% dos projetos são feitos sob encomenda das agências. Isso permite um alinhamento entre as ações relativamente anárquicas dos guerrilheiros e a linha geral do marketing. Uma ação de guerrilha mal planejada ou conduzida de forma amadora pode resultar em desastres para a imagem. Recentemente, o Greenpeace promoveu uma ação de guerrilha no vão central da ponte Rio-Niterói. Realizada de forma clandestina e sem autorização oficial, a ação provocou um engarrafamento de 5 quilômetros nos acessos à ponte e protestos indignados de motoristas contra a entidade em sites como Twitter e Orkut. Em sua afoiteza por aparecer, os verdes do Greenpeace violaram um princípio básico do manual do guerrilheiro: a falta de estratégia é um erro fatal.

Fonte: http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0946/marketing/manual-guerrilheiro-479109.html

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